terça-feira, 24 de maio de 2011

Ele não entendia.

- É que ele tinha essa estranha mania de guardar os outros dentro de si. Como que em processo de colecionar pessoas, guardava seus amigos, sua familia e seus amores. Sim, no plural. Amores. Como lera certa vez, não se esquecia de quem amou, dava um passo adiante em direção a um novo amor. E assim ele seguia sua vida monótona e regada a essas tantas xícaras de café e cigarros pacientemente fumados. Vez ou outra sentia uma inquietude quase sufocante, que lhe provocava uma torrente de projetos e planos bem elaborados, que o faziam sair daquela inércia e caminhar em direção de algo novo que não fosse ela. Se funcionava? Claro que funcionava, mas só por algum tempo, pra sermos sinceros.

Áquela sacada do quarto, onde ele sempre se sentava pra olhar o dia renascer, fumando seu cigarro companheiro e bebendo seu café que agora fazia o papel que em outrora era dela, de aquecer-lhe, era o lugar preferido de sua existencia. Tinha uma singularidade especial, e ele nem conseguia imaginar-se longe dela, sem ver dia-apos-dia, o sol nascendo o chamando pra traduzir os sentimentos alheios em meio a versos bem rimados, e contos bem elaborados. Gostava de perceber como as pessoas se identificavam com as suas dores, os seus amores, e suas alegrias em ver o sol nascendo ou se pondos. Em ver detalhes pequenos, mas por demais significativos para quem tem olhos que sentem.

Ah... se era nostalgico? Ao extremo. Seus guardados, seus achados, seus versos, sua mania de esquilo. Tudo isso podia ser definido como seu tesouro. Talvez a tristeza que trazia nos olhos fossem tambem um dos seus bens mais valiosos, talvez essa tristeza que as pessoas julgavam como algo ruim, fosse só uma forma torta de sentir. Uma forma torta de ser, para quem vivia tão aparentemente cheia de alegria, que não lhe cabia tristezs alguma. Então ele as guardou todas dentro de si, pra que a alegria dela sempre fosse radiante, e ele fizesse o que mais gostava, olhar a sua alma transpirar felicidade. Só esqueceu-se que tristeza de mais vira câncer, e apesar da boa intenção, isso não o salvaria de tamanha melancolia.

Ele a achava tão bela, tão única, tão ela. E era como se já sentisse a dor da perca antes mesmo de ter ganhado. Talvez por isso a derrota fosse constante. Era sempre derrotado pela atenção pros livros, pelos videos, as musicas, as flores, os passaros, o céu, as estrelas, ate pelo cachorro. Tudo tinha lugar no mundo dela, menos ele. Ela dizia que ele era em quem ela mais confiava. E ele se sentia como se fosse capaz de resolver todos os problemas dela. Tolo! Não era capaz nem de resolver os seus, quem dirá em um passe de mágica fazer desaparecer todas suas preocupações e vertigens provocadas por sua incapacidade de se desligar do mundo. Ele nao entendia que ficar proximo nao resolveria nada. Ele não entendia...

Julgava que amor fosse milagre, mas viu que milagre mesmo é deixar de amar. Por isso acreditava em passos adiante no rumo de um outro novo amor, nunca em esquecer-se de vez. Então guardava seus amores passados e os traduzia em pseudonimos, pra que os visse sempre de uma distancia segura e sem negar sua existencia. Nunca negara sua sentimentalidade, e isso o tornara íntegro quando parou de lutar contra o que a torrente trazia, finalmene encontrou-se consigo. E não, isso não era o fim, era o começo de tudo o que ainda estava por vir, de tudo que ele poderia fazer acontecer. Seu jeito torto de amar, seu jeito torto de sentir tambem era sentido por mais pessoas, e isso fazia com que ele nao se sentisse só, como se sentira permanecendo ao lado dela. Então ele partiu rumo a outro amor, mas sem conhecer o milagre de esquecer.

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